A criação do novo órgão governamental para fazer a gestão dos processos de imigração parecia ser a solução para acabar com o atraso na tramitação e validação dos pedidos de residência. A AIMA (Agência para a Integração, Migrações e Asilo) nasceu em outubro do ano passado, com a extinção do SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras), que até então estava à frente destas atividades.

Por enquanto a AIMA não resolveu pendências do SEF
Índice Em vez de melhorar, piorou Falta agilidade para acompanhar os processos Sem documentação é como se a vida parasse Imigrantes se mobilizam AIMA se posiciona

A ideia é que, ao passar todas as tarefas administrativas para a nova agência, o sistema ficaria mais ágil e os processos andariam mais rápido. Porém, a primeira dificuldade foi com a “herança” recebida do SEF: a AIMA entrou em operação já herdando mais de 300 mil processos acumulados ao longo dos últimos anos.

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Em vez de melhorar, piorou

Um estudo divulgado recentemente aponta que a maioria dos imigrantes está preocupada com o atraso da tramitação da documentação legal, o que acaba se configurando como um dos principais problemas para a integração no novo país.

O documento “Percepções e Expectativas dos Nacionais de Países Terceiros (NPT) na Diocese de Lisboa”, de autoria de pesquisadores da Universidade Nova de Lisboa (Nova SBE), considera que o fim do SEF acentuou os problemas, especialmente as questões burocráticas, os atrasos nos processos de regularização e as falhas nos sistemas de suporte.

Em entrevista para a Agência Lusa, a pesquisadora Rita Nascimento lembra que a falta de documentação afeta a integração profissional e social no país.

“Sem documentos é mais fácil a exploração, é mais difícil ter acesso a uma casa ou a um emprego bom e há um aumento da exclusão por pobreza”.

Advogados ouvidos pela imprensa portuguesa partilham a mesma percepção. Na opinião geral dos entrevistados, a troca do SEF pela AIMA deveria melhorar todo o processo, pois estava tudo muito ruim. Mas, “na prática, piorou”, porque não foi feita a migração das bases de dados pendentes, criando novos gargalos.

Falta agilidade para acompanhar os processos

Segundo o estudo da Nova SBE, “a promoção de políticas favoráveis à migração regular” não foi acompanhada pela “adaptação das instituições públicas”. Em outras palavras, a crítica aponta que o governo tem políticas mais abertas em relação à imigração, mas não tem se mostrado preparado para receber todas as demandas geradas pelo grande fluxo de pessoas.

O governo português tem adaptado e revisto as suas políticas para melhor gerir as dinâmicas da migração, desde a simplificação dos processos para obtenção de documentos a iniciativas de integração e proteção dos direitos dos imigrantes, mas a implementação dos planos tem sido lenta.

“Muitas falhas são atribuídas ao ‘suporte governamental e institucional’, com o reduzido apoio financeiro às associações ligadas às questões da imigração, além da falta de comunicação com todos aqueles que estão nas ruas em contato direto com os imigrantes”, aponta o estudo.

Sem documentação é como se a vida parasse

“As pessoas não podem fazer nada, não podem ir a um funeral no seu país, não podem trazer filhos, ficam com a vida bloqueada à espera da regularização”, afirmou um advogado à agência Lusa.

Os pesquisadores da Nova SBE reforçam que a falta de documentos bloqueia a vida dos imigrantes que estão à espera da análise dos seus pedidos. E os pesquisadores continuam, mencionando os perigos dessa demora:

“Sem os documentos problemas de emprego e exploração, com inúmeras situações relatadas de trabalho informal, ausência ou atraso do pagamento de salários, e, em casos mais extremos, entradas no país através de redes de imigração ilegal ou tráfico humano, com condições desumanas”.

A situação é comum e atinge milhares de imigrantes no país. “Todos os dias alguém me manda uma mensagem e me comunica mais um atraso, uma ausência de resposta”, relatou outro advogado em Portugal que atua na área da imigração.

Imigrantes se mobilizam

Diante das dificuldades, grupos de imigrantes começam a se mobilizar e pressionar as autoridades. Reportagem do jornal Diário de Notícias ouviu manifestantes que se reuniram diante da sede da AIMA em Lisboa para pedir uma solução para as centenas de processos pendentes.

“A AIMA manda-nos ir ao Instituto dos Registos e Notariado (IRN), que nos manda falar com a AIMA. Ninguém resolve, ficamos perdidos”, declarou um imigrante paquistanês.

Não sabemos quem são os responsáveis, estamos desamparados”, reforçou um cidadão argelino, que espera a autorização de residência para morar em Portugal e arrisca perder o emprego por falta de documentação.

AIMA atrasa documentação
O gargalo da AIMA se afunila com o passar das semanas, os processos chegam e as pendências não são liberadas.

Casos como esses se repetem e não escolhem cidadania: há brasileiros, indianos, paquistaneses, argelinos, todos estão na mesma situação.

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Os imigrantes estão desesperados”, afirmou um brasileiro que aguarda desde novembro a renovação do seu título de residência. “Estou em incumprimento com a lei, mas não por minha culpa ou vontade”, completa.

AIMA se posiciona

Durante a manifestação, representantes da AIMA conversaram com os imigrantes e deram um prazo de poucos dias para os casos apresentados serem solucionados. Ainda segundo a agência, foram emitidos 80 mil títulos de residência desde outubro de 2023, data em que a nova agência começou a operar.

Para a reportagem do Diário de Notícias, a AIMA afirmou que já recebeu mais de 200 mil mensagens eletrônicas desde o início das operações e que “procura responder a todos”. Além disso, confirmou que será lançado um centro de contato ainda neste trimestre.

Em entrevista para o portal da Ordem dos Advogados no início de 2024, o presidente da AIMA confirmou que a solução para todas as pendências herdadas não seria de tão curto prazo.

“A intervenção que temos de realizar para mudar a forma de trabalhar é de tal maneira transformadora que dificilmente se começará a sentir um impacto notório e visível antes de decorrido um largo período de tempo, designadamente alguns meses”, declarou Luís Goes Pinheiro.

Ele falou também sobre o que esperam para os próximos meses:

“A nossa expectativa é que, após termos estas ferramentas implementadas, no prazo de um ano e meio a pendência desapareça e, a partir daí, estaremos capazes de lidar com a procura diária”, complementou Pinheiro.

Em março, como já divulgado pelo Euro Dicas, um passo importante foi dado, com a assinatura de protocolos com as ordens dos Advogados e Solicitadores, que passarão a trabalhar com a AIMA na avaliação da documentação dos imigrantes, permitindo que os processos avancem de forma mais rápida.