Mudanças nos direitos dos estrangeiros têm sido discutidas na França e as regras da imigração no país podem mudar. Essas alterações são discutidas especialmente sob argumentos como segurança pública e preferência nacional.

Controle de imigração e passaportes na França
Índice Lei de imigração começa a vigorar progressivamente Como ficam os planos de mudança das regras após a vitória da Nova Frente Popular? Programa eleitoral previa redução dos direitos dos imigrantes Filhos de imigrantes nascidos na França poderão não ter direito à nacionalidade francesa Projetos de lei podem ser considerados inconstitucionais Imigração divide opiniões no país Discussões sobre a lei de imigração na França não são recentes

Agora, com a nova composição da Assembleia Legislativa, o cenário fica nebuloso e pode bagunçar a aplicação da lei aprovada na última badalada de 2023. Veja o que está em jogo.

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Lei de imigração começa a vigorar progressivamente

Passados aproximadamente sete meses desde que a controversa lei de imigração na França foi votada e aprovada, os textos que compõem o novo conjunto de regras começam a entrar em vigor pouco a pouco.

No último dia 16 de julho, diversos decretos foram publicados no Journal Officiel (Diário Oficial) – decretos que alteram sensivelmente o artigo sobre entrada e permanência de estrangeiros na França, em numerosas situações, incluindo pedidos de asilo.

Em poucas palavras, é impossível saber. A coalizão de esquerda Nouveau Front Populaire (Nova Frente Popular) tem em seu programa de governo a revogação da lei de imigração, mas fazer valer o desejo da esquerda será um verdadeiro tour de force.

Isso porque apesar da vitória, é preciso lembrar que o partido não conseguiu formar maioria no Parlamento Europeu. Os 190 assentos conquistados pelo NFP são substanciais, mas estão longe dos 289 necessários para que a legenda seja considerada maior.

Mesmo assim, há poder de fogo para que a Nova Frente Popular consiga negociar cargos altos, inclusive indicar um novo primeiro-ministro – função que, grosso modo, permite governar mais do que o próprio presidente.

No entanto, até o momento, esquerda, centro e direita têm batido cabeça nos bastidores para chegar a um acordo do novo nome. Os Jogos Olímpicos comandam, nesse instante, todas as agendas públicas.

Nos bastidores, porém, a briga pela escolha segue para ver quem vai subir ao pódio político numa triangulação difícil de prever. Cumpre anotar que a lei foi votada em dezembro e começou a vigorar em 28 de janeiro de 2024 – o princípio de anterioridade aliado à sanção presidencial faz com que a lei siga valendo até o momento.

Base do governo corre para publicar medidas no diário oficial

O governo de Emmanuel Macron sabe das dificuldades e não quer correr riscos. É justamente por isso que a publicação no Diário Oficial francês chama a atenção. O primeiro-ministro francês ainda é Gabriel Attal, 35, homem de confiança do presidente.

Com a nova formação de governo, esperada para as próximas semanas, Macron definitivamente perderá seu braço direito no executivo e será mais difícil fazer vigorar pontos-chave da reforma migratória, sugere o Public Sénat.

Há chances de a lei ser revogada, mas qualquer suspeita não passa, nesse momento, de mera suposição.

A aplicação do artigo 46 pode trazer mudanças na autorização de residência de imigrantes. O artigo explicita que qualquer estrangeiro que solicite autorização de residência na França deve comprometer-se, através da assinatura de um contrato, “a respeitar os princípios da República”.

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O dispositivo, reporta o Public Sénat, foi introduzido pela direita e foi objeto de debates sobre a própria natureza que caracterizaria tais princípios republicanos. No fim das contas, a lista definitiva trouxe os seguintes pontos:

  • Respeito à liberdade pessoal;
  • Respeito à liberdade de expressão e de consciência;
  • Respeito à igualdade entre mulheres e homens;
  • Respeito à dignidade da pessoa humana;
  • Respeito ao lema e aos símbolos da República;
  • Respeito à laicidade do Estado.

Os princípios, num primeiro momento, são objetivos. Mas o dispositivo indica que poderá ser recusada ao imigrante a renovação do documento, ou mesmo revogada a autorização “em caso de violação grave de um destes princípios”.

Mais mudanças na aplicação da lei

O dispositivo obligation de quitter le territoire français (OQTF ou obrigação de saída do território francês) é um mecanismo que exige que um imigrante, tendo cometido uma infração, saia do território em um prazo determinado: antes da lei, eram 30 dias. Agora, 15.

Este endurecimento tem como prerrogativa a expulsão de “malfeitores” do país com mais rapidez, mas a medida é contestada por associações alinhadas à esquerda e por organizações de defesa de imigrantes sem documentos.

Para essa ala, a lei parece muito inflexível e pode representar risco a pessoas que buscam na França abrigo por questões humanitárias. Estrangeiros nessas situações normalmente não têm documentos por estarem em situação de extrema fragilidade, como aqueles que fogem de nações em guerra ou com graves instabilidades sociais.

Outras mudanças no horizonte

Completam o pacote de austeridade multas administrativas a empresas francesas que empregarem estrangeiros sem autorização de trabalho (sans papier) e a aplicação mais rigorosa do regime de prisão domiciliar para estrangeiros em processo de expulsão – aqueles que se enquadram na execução do OQTF.

Programa eleitoral previa redução dos direitos dos imigrantes

As propostas encabeçadas pelo Rassemblement National (RN, ou Reagrupamento Nacional) indicavam, segundo informações do Les Echos, que o RN tinha interesse em “suspender imediatamente a regularização” de estrangeiros sem documentos, caso a legenda tivesse sucesso nas eleições legislativas francesas, finalizadas em 7 de julho de 2024.

Na ocasião, o RN ficou em terceiro lugar, atrás do NFP, em primeiro lugar e do Ensemble, a coalizão formada por partidos caros ao macronismo, em segundo.

As duras declarações passaram à época pelo aval de Jordan Bardella, presidente do RN e então favorito a embolsar o pleito das votações. O RN, assim como as demais coalizões, não formou maioria, e agora espera manter vivo o interesse pela lei de imigração aprovada em dezembro último.

Prédio do Conselho Constitucional na França
Membros do Conselho Constitucional podem vetar pontos da nova lei; direito ao solo é ponto mais crítico

Bardella, que incorpora e repercute o sentimento de uma parcela significativa da sociedade francesa, anunciou que os estrangeiros que não exercem nenhuma atividade profissional há seis meses seriam “convidados a retornar ao seu país de origem”.

O programa eleitoral do RN destacava o interesse do partido em “reduzir drasticamente a imigração legal e ilegal e expulsar os delinquentes estrangeiros”, medida que poderia afetar diretamente não apenas aqueles que vivem ilegalmente por razões diversas, incluindo questões humanitárias, mas também imigrantes que estão legalmente no país.

Dados recentes do Insee revelam que cerca de 5,3 milhões de estrangeiros vivem no país, cerca de 7,8% da população.

Filhos de imigrantes nascidos na França poderão não ter direito à nacionalidade francesa

Atualmente, uma criança filha de pais estrangeiros, mas que tenha nascido na França, tem direito à nacionalidade francesa ao completar 18 anos. A proposta de partidos de direita, que esteve em debate nas eleições legislativas, é dificultar a obtenção da cidadania francesa.

Informações reunidas pela rede France Info mostravam que as propostas do Rassemblement National e do Républicains (Republicanos), liderado por Eric Ciotti, tinham objetivo de restringir esse direito. Embora não tenha embolsado o pleito, a direita conta com assentos suficientes para manter aceso o debate sobre a limitação do direito à cidadania.

A abolição do droit du sol (direito ao solo, em tradução livre) desejada pelos partidos contrasta com a legislação atual e fere um dos princípios que regem a constituição.

Aqui cabe explicar que a nacionalidade francesa não é automática àqueles nascidos no país: é preciso cumprir requisitos, como morar de modo ininterrupto ou escalonado na França.

Processo ficaria mais complexo

A proposta criaria mais uma camada de dificuldade em um processo que, pela própria natureza, já é bastante burocrático.

Franck Allisio, deputado do Rassemblement National, ouviu à época das votações, de uma estrangeira cujo filho nasceu na França, que a mudança da lei é “inadmissível”. As informações são da BFMTV.

“Acho isso inaceitável […] Na França, quando falamos de direito do solo, as pessoas pensam que as crianças nascem e têm imediatamente a nacionalidade francesa, mas isso não é absolutamente o caso. [Eu] não estive em anos consecutivos na França [como exige a lei], o que significa que meu processo foi interrompido. A certa altura, eu desisti. No entanto, continuo pagando impostos”.

A alteração proposta é possível, mas não ocorrerá sem desgaste. Para isso, a coalizão de direita terá de dialogar com atores bastante diversos na Assembleia Nacional, onde tem poucos assentos, e no Senado – algo que pode levar tempo e ser infrutífero.

Projetos de lei podem ser considerados inconstitucionais

Especialistas têm observado que diversas das medidas propostas pelos partidos em ascensão são incompatíveis com a constituição. Analistas afirmam que as propostas provocam o que o Conselho Constitucional poderia considerar como um “ataque desproporcional aos direitos de proteção social dos estrangeiros”, segundo o portal Challenges.

De todos os pontos críticos, o aspecto que mais seria suscetível a vetos das instâncias mais altas do Estado francês diz respeito ao direito ao solo (droit du sol).

Conforme a constitucionalista Anne-Charlène Bezzina, ouvida pelo Charente Libre, a existência de um direito ao solo para acesso à nacionalidade francesa é “de aplicação constante desde o Código Civil de 1804”.

Imigração divide opiniões no país

Se o recorte for apenas 2024 será difícil cravar o que os franceses pensam sobre a imigração. Há diversas pesquisas de opinião encomendadas por veículos de imprensa, por exemplo, que acabam por traduzir um sentimento enviesado.

Na França, o canal CNews publicou em 2 de junho uma pesquisa indicando que mais de dois terços dos franceses (68%) relacionam insegurança com o aumento da imigração.

Ocorre, porém, que as pesquisas abordam questões que, como identificado pela Confederação Democrática Francesa do Trabalho (Cfdt), são imprecisas. Algumas das afirmações que foram rebatidas pela Cfdt incluem:

  • Estrangeiros ilegais têm uma cobertura de saúde melhor do que a dos franceses: a Ajuda Médica do Estado (AME) é uma cobertura de saúde que oferece atendimento básico para estrangeiros sem autorização de residência (titre de séjour). Não cobre atendimento de alto nível ou taxas extras, já que estas devem ser pagas pela pessoa e não pelo Estado;
  • Estrangeiros idosos recebem dinheiro do governo assim que chegam à França, sem nunca terem trabalhado: o Subsídio de solidariedade para idosos (Aspa na sigla em francês) é um benefício social mínimo pago aos aposentados de renda muito baixa que vivem na França. É preciso ter contribuído com a previdência francesa por anos para receber o dinheiro;
  • A França está sendo invadida por estrangeiros: em 1931, a proporção de estrangeiros na França era de 6,6%. Dados do Insee indicam que o volume atual é de 7,8%. O aumento em quase um século é de apenas 1,2%;
  • Os estrangeiros estão tirando os empregos dos franceses: imigrantes ocupam cargos que estão com falta de mão de obra, sendo responsáveis por 38,8% dos trabalhos domésticos, 28,4% dos cargos de vigilância, 24,1% de trabalhadores não qualificados da construção civil e 22% de cozinheiros.

Discussões sobre a lei de imigração na França não são recentes

As discussões sobre a lei de imigração na França datam pelo menos desde 2015. O ano é frequentemente lembrado pelo volume de mortos, já que 130 pessoas foram assassinadas naquele ano em ataques terroristas – 90 delas na casa de espetáculos Bataclan.

Os atentados motivaram reações da opinião pública francesa que, associada a um crescente movimento de guinada nacionalista, deu força a partidos como o RN (vitorioso nas eleições europeias deste ano e forte candidato a levar a melhor nas legislativas em andamento).

Os episódios de 2015 motivaram a aplicação da Lei de Segurança Global e ofereceram as bases para formulação da Lei anti-imigração que são objeto de discussões até o momento.

O sentimento de preferência nacional atinge com força a comunidade de imigrantes que vivem na França, em especial os considerados sans papier, pessoas que buscam asilo no país ilegalmente. Se as mudanças realmente acontecerem, o acesso a documentos e os direitos de estrangeiros frente aos franceses poderão ficar mais limitados.